Chá Hoasca, mais do que inofensivo, benéfico
José Roberto Campos de Souza*
| 14 março 2017
A expansão e a consequente visibilidade do chá Hoasca (Ayahuasca, no meio acadêmico, e Vegetal, na UDV) suscitou, em muitos momentos, a crítica (sem embasamento) de que seu uso seria potencialmente arriscado ou lesivo à saúde. A primeira crítica na imprensa foi publicada ainda na década de 70, no Jornal Alto Madeira (Porto Velho- RO), em que um psiquiatra tecia considerações afirmativas de potenciais danos à saúde dos seus usuários (de novo, sem embasamento).
Ressalte-se o aspecto positivo de tais ponderações, que fizeram com que o Centro Espírita Beneficente União do Vegetal viesse a público, não apenas refutando tais alegações a partir das suas observações empíricas, mas também abrindo suas portas às pesquisas e avaliações, na serena certeza dos já observados benefícios aos seus associados.
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Efeitos benéficos do uso regular
Alguns marcos dessa trajetória merecem destaque, a exemplo do Projeto Hoasca, um extenso e exaustivo trabalho realizado na década de 90. Oficialmente denominado “Farmacologia Humana da Hoasca”, o projeto envolveu nove entidades, entre universidades do Brasil, Europa e Estados Unidos, com apoio logístico do Centro e irrestrita abertura investigativa, atitude que impressionou os pesquisadores por seu ineditismo no mundo acadêmico. Essa avaliação, que abordou os aspectos clínicos e psiquiátricos dos usuários do Chá, após a determinação dos seus princípios ativos e mecanismos bioquímicos de atuação, trouxe a comprovação do que já sabíamos: o chá é inofensivo à saúde. Mas, mais do que isso, a pesquisa trouxe claros indicativos de potenciais efeitos benéficos do seu uso regular.
Já naquele momento, a pesquisa “Farmacologia Humana da Hoasca” indicou alguns benefícios do uso ritualístico do Chá Hoasca, como um reequilíbrio da condição mental-emocional dos seus usuários – sócios da UDV –, bem como a recuperação de usuários de tabaco, álcool e outras drogas. Além disso, a pesquisa mostrou que os sócios do Centro eram comparativamente mais equilibrados emocional e afetivamente do que os não-sócios do grupo controle, que nunca haviam bebido o Chá. Essa pesquisa, até hoje a melhor referência para o mundo acadêmico sobre o uso do Vegetal, abriu um leque de opções para um eventual potencial “terapêutico”, pelas inacreditáveis transformações observadas na vida dos sócios que participaram do estudo.
Universidade da Califórnia
No final da década de 90, ressurgiu o questionamento acerca de possíveis efeitos deletérios do Chá Hoasca, quando usado por crianças e jovens, por estarem em fase de desenvolvimento. Mais uma vez, o Centro tomou a inciativa de incentivar uma pesquisa com indivíduos desse grupo etário que frequentassem regularmente as sessões, comparando-os com um grupo assemelhado de jovens que nunca haviam comungado o Chá. A Universidade da Califórnia e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) foram as que se mobilizaram no sentido de fazer o Protocolo de Pesquisa, bem como a coleta, análise e publicação dos resultados. Essa pesquisa avaliou questões de memória e concentração, uso de álcool ou outras drogas, aspectos comportamentais etc. Mais uma vez, confirma-se a inocuidade do Chá, também para esse subgrupo populacional e, novamente, surgem indicativos de potenciais efeitos benéficos de seu uso ritual.
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Deste trabalho, vale ressaltar alguns trechos de suas conclusões:
“Os dados qualitativos mostram que os adolescentes da União do Vegetal parecem ser saudáveis, pensativos, humanitários e ligados a suas famílias e pares religiosos.”
“Os adolescentes que usam a ayahuasca em um ambiente controlado eram na maior parte comparáveis ao grupo de controle, exceto por uma proporção consideravelmente menor de usuários de álcool. A afiliação religiosa parece ter exercido um papel decisivo como um fator moderador para o uso do álcool.” (grifo nosso).
“Observou-se que, comparado aos controles, foram encontradas frequências consideravelmente menores nos níveis de ansiedade, de distúrbios dismórficos (preocupação intensa com a aparência) e de problemas de concentração, detectados entre adolescentes usuários da ayahuasca a pleno despeito dos perfis psicopatológicos similares revelados no estudo de ambos os grupos. As baixas frequências dos sintomas psiquiátricos detectados entre os adolescentes que consomem a ayahuasca dentro de um contexto religioso podem refletir a influência positiva da sua afiliação religiosa.”
Efeito antidepressivo do Chá Hoasca
Em anos mais recentes, houve um incremento considerável no interesse da comunidade acadêmica pelo Chá e seus efeitos, com múltiplas pesquisas sendo realizadas mundo afora, cujos resultados corroboram nossas observações empíricas e, também, a palavra de nosso Guia, o fundador da UDV, Mestre Gabriel. Pesquisa recente realizada por cientistas da Universidade de São Paulo (USP) evidenciou o claro efeito antidepressivo do Chá. Esse trabalho, noticiado pela respeitada Revista Nature, veio confirmar o que já sabíamos:
Os resultados mostraram que houve melhora em todos os participantes, independentemente do grau de depressão que apresentavam. De acordo com um dos questionários, no dia seguinte ao experimento, houve uma redução de 62% nos sintomas. Uma semana depois, o efeito continuava a se ampliar, chegando a 72%. Segundo outro questionário, três semanas depois da ingestão da dose a diminuição de sintomas como tristeza, dificuldades de concentração, fantasias suicidas e pensamento negativo havia chegado a 82% (Nature | doi:10.1038/nature.2015.17252).
Potencialização da produção de células nervosas
Outra pesquisa, realizada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mostrou que o uso do Chá potencializa a produção de novas células nervosas, bem como um incremento na formação dos dendritos – os “dedos” –, que permitem a comunicação entre as células, formando uma “rede” de comunicação que permite a melhora das funções cerebrais. Quanto maior o número de células interligadas, melhor o rendimento, inclusive no aprendizado de novas habilidades. Essa capacidade, aliada ao mecanismo de ação de um dos componentes do chá, que age como um neurotransmissor, promovendo a “ligação” entre as células nervosas, confere-lhe uma característica, rara, de ser uma substância “psicointegradora”, ou seja, facilitadora do desenvolvimento do potencial humano, no sentido do bem.
O interesse por essa vertente surgiu a partir da observação dos resultados da pesquisa citada anteriormente. A observação do efeito antidepressivo do chá Hoasca trouxe a indagação do porquê desse fenômeno, para saber se seria um efeito transitório de alguma substância presente ali, ou – como se sugere – de mudanças estruturais desencadeadas por seu uso.
Algumas de nossas observações empíricas ainda carecem de comprovação metodológica. Uma delas é a baixa – quase inexistente – ocorrência de déficit cognitivo, ou Alzheimer, entre nossos idosos. Estas observações mantém nossas portas abertas ao investigador sério e comprometido com a verdade e a ética na pesquisa.
O fato é que, desde que a União do Vegetal tomou a iniciativa de abrir suas portas para a comunidade científica, a ciência acadêmica vem confirmando o que a ciência espiritual sempre mostrou: o Chá é um facilitador do objetivo estabelecido pelo Mestre Gabriel, “trabalhar pela evolução do ser humano, no sentido de seu desenvolvimento espiritual”.
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*Integrante do Quadro de Mestres do Núcleo Luz de Maria (Campo Grande -MS) e ex-diretor do Departamento Médico e Científico (DEMEC) da Diretoria Geral do Centro Espírita Beneficente União do Vegetal.