Há 33 anos, UDV chegou a Campo Novo (RO)

Thiago Beraldo*

| 31 dezembro 2016

Irmandade do Núcleo Campo Novo | DMC/Núcleo Campo Novo

Neste dia 31 de dezembro de 2016, está inteirando 33 anos que foi realizada a primeira sessão da União do Vegetal em Campo Novo (RO), dando sequencia a um trabalho iniciado na Bolívia. No inicío, o Núcleo Campo Novo fazia parte da 1ª Região do Centro Espírita Beneficente União do Vegetal. Atualmente, ele faz parte da 6ª Região.

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Divina Providência

A história do Núcleo Campo Novo começou em 1977, quando uma parte da irmandade da Distribuição de Vegetal da Divina Providência no Rio Mamo, Bolívia, decide deixar a região devido às perseguições da polícia boliviana. Na época, o responsável pela Divina Providência era o Mestre Zé Pretinho.

Orlando Melgar de Oliveira (conhecido como Pilonti), Luis Noel Souza Neves e Raimundo Nonato da Costa que, mais na frente, viriam a compor o Quadro de Mestres do Núcleo Campo Novo, contam que a polícia boliviana proibia os seringueiros de beber o Vegetal. Nonato relata que chegou a ser “preso” com outras pessoas. Preso entre aspas porque, naquela época, no coração da Amazônia, ser preso era ser colocado num buraco cavado no chão da floresta onde não se podia escapar. Luis Noel, através de contatos com autoridades locais bolivianas, conseguiu que seus amigos fossem soltos, desde que parassem com aquela “beberagem estranha”.

Nos seringais de Rondônia

Assim em 1977, Orlando e Luiz Noel com suas familías e mais algumas pessoas decidem morar na região do Alto Candeias/RO. Passando por Porto Velho, Orlando pede ao então Mestre Geral Representante, João Ferreira da Souza (Mestre Janico), uma carta de apresentação. Pede também autorização para preparar e beber o Vegetal com sua família e demais pessoas.

A região do Alto Candeias, para onde se dirigiam, era o verdadeiro faroeste caboclo. Se, na década de 70, as cidades da BR 364 em Rondônia eram pequenas vilas, o interior do estado ainda não tinha nem estrada de acesso. O deslocamento acontecia pelos rios e “picadas” pela mata. Viviam na região, diversos grupos indígenas isolados e recém contatados, assim conflitos com seringueiros eram frequentes. Para engrossar o caldo, aventureiros perambulavam pela floresta atrás de minério.

Orlando passa a morar em uma colocação no pé da serra do Tracoá (Região que no futuro viria a ser o Parque Nacional de Pacaás Novos) e Noel, às margens do Rio Candeias. Como a viagem a pé entre as colocações demorava 8 horas, a distribuição de Vegetal começa a funcionar com as sessões no 1º sábado do mês na casa do Noel e, no 3º sábado, na casa do Orlando.

Em 13 de fevereiro de 1980, o então Mestre Geral Representante, Raimundo Carneiro Braga (Mestre Braga), resolve designar o irmão Orlando, já no Corpo Instrutivo, para responder pela Distribuição Autorizada de Vegetal do Alto Candeias.

Chegada a Campo Novo

Devido ao aumento das “fofocas” de garimpo, é aberto no meio da floresta, próximo às margens do rio Candeias, um novo campo de pouso e decolagem de monomotores para a retirada de minério. Junto à pista se forma um pequeno vilarejo que é batizado como Campo Novo, designação essa que viria a inspirar o nome do futuro Núcleo.

Com o desenvolvimento do pequeno vilarejo, em 31 de dezembro de 1983, já no Quadro de Mestres, Orlando distribuiu Vegetal pela primeira vez na localidade, em sua casa. Em 31 de dezembro de 1988 é inaugurado o primeiro templo da distribuição em terreno próprio doado por mestre Orlando.

No ano de 1990, o grupo atravessou um momento difícil e em 12 de agosto, o Conselheiro Amarildo Felício de Oliveira fica responsável pela distribuição. Dois anos depois, em julho de 1994, o conselheiro Francisco das Chagas de Jesus muda-se de Ariquemes/RO (onde era sócio do Núcleo Mestre Ramos) para Campo Novo com sua família e forma a primeira diretoria da distribuição.

Organização e crescimento

Em 6 de janeiro de 1995, o conselheiro Francisco das Chagas recebe a responsabilidade pela Distribuição de Vegetal, sendo convocado para o Quadro de Mestres em 1996. Em 27 de Março de 1998, a Distribuição Autorizada de Campo Novo é elevada à Pré-Núcleo e em 31 de dezembro de 2000, o Pré-Núcleo é elevado à Núcleo Campo Novo, permanecendo na representação o mestre Francisco das Chagas. No ano de 2000, também acontece o desmembramento do Pré-núcleo Mestre Nesclar localizado na cidade de Buritis/RO.

Depois deste período, os representantes dos respectivos triênios são: de 2003/2005 mestre Erminio Gurkewicz, de 2006/2008 mestre Geraldo Alves Ferreira, de 2009/2014 mestre Aldenir Pereira de Oliveira, filho do mestre Orlando. A partir de 2015 até a presente data, mestre Erminio Gurkewicz dá seguimento ao trabalho como representante, após ter sido Mestre Central da 6º Região na gestão anterior.

A amizade de Mestre Pequenina

Duante todos esses anos a amizade e a fraternidade fizeram parte dessa história. No início da distribuição, Mestre Pequenina passou a ter um cuidado especial pelas irmandades simples que viviam no meio da floresta, tanto nos Rios Mamu, quanto no Alto Candeias. Foi uma pessoa que visitou com frequência as localidades, oferecendo sua amizade e ensinando. Sua casa também era o ponto de apoio nas idas à Porto Velho. Pela convivência, as pessoas mais antigas a consideravam uma verdadeira mãe.

Mais na frente, o Núcleo Mestre Ramos, em Ariquemes, passou dar o suporte necessário para a irmandade, mesmo nos momentos mais difíceis, sempre apoiando e visitando. Hoje, a irmandade do Núcleo Campo Novo tem um intenso convívio com os outros Núcleos próximos em um trabalho de cativar e ser cativado, fortalecendo os laços de amizade.

A bela floresta

O Núcleo Campo Novo possui plantio de Mariri e Chacrona, mas a grande beleza de lá está fora do terreno, pois é uma região que ainda possui boa quantidade de Floresta Amazônica Nativa, pois localiza-se ao lado do Parque Nacional de Pacaás Novos e da Terra Indígena Uru-eu-wau-wau que totalizam 1.8 milhões de hectares. Assim, ainda muitos dos momentos marcantes do Núcleo acontecem nas idas para floresta, nas mensagens de Mariri e Chacrona nativos onde a irmandade e os visitantes podem se encantar com as belezas da Natureza e aprender mais a respeito dos seus segredos através do conhecimento caboclo da pessoas.

Gratidão

Cheguei na UDV no Núcleo Campo Novo em 2002, onde encontrei num ranchinho de palha, um povo que tinha pouca coisa material para oferecer mas que era guardião de uma grande riqueza. A irmandade me mostrou, através dos ensinamentos do Mestre Gabriel, o que era a verdadeira sabedoria e nobreza. A simplicidade das pessoas, o bom tratamento de uns com os outros imprimiu em mim e nas pessoas que vem conhecendo este Núcleo, um sentimento de amizade verdadeira que é um dos grandes legados de Mestre Gabriel.

Com carinho e eterna gratidão, nosso reconhecimento e admiração por todos que vem participando dessa bonita história. Que o este Núcleo continue a se desenvolver conservando suas raízes e simplicidade. Viva o Núcleo Campo Novo, viva a União do Vegetal!

*Thiago Beraldo é integrante do Quadro de Mestres do Núcleo Príncipe Teceu (Brasília-DF).

7 respostas
  1. aurenio candido
    aurenio candido says:

    Meu primeiro copo de vegetal que bebi foi duplo e foi dado pelo então responsável da distribuição na época, cons. Amarildo. Era uma pequena casa de madeira, noite de lua cheia no mês de agosto, alguns dia após o meu aniversário, em 1992. Neste dia fiz uma viagem astral. Desejo sucesso à irmandade. Luz, paz e amor. Moro em Recife, Núcleo Cajueiro.

    Aurenio Candido
    31 -12-2016.

  2. Marcel Voos de Souza
    Marcel Voos de Souza says:

    Lugar incrível que vale muito conhecer.
    Povo simples, sem muitos recursos materiais, mas com uma grande riqueza no coração e na amizade com as pessoas.
    Devemos preservar lugares assim e fortalecer a essência caianinha que é possível encontrar no exemplo de Campo Novo.

  3. Santos Reis
    Santos Reis says:

    Andei nesta Região algumas vezes, Tenho boas recordações. Realmente a Mestre Pequenina tinha uma atenção especial por aquela irmandade, quando ía em Ariquemes, andei com ela naquela Região e vi a atenção que ela dedicava com as pessoas daquele lugar. Ao ver este depoimento me transporto aquele tempo e vislumbro a simplicidade de uma época e um povo que até hoje me faz sentir saudades pela forma como viviam, mesmo enfrentando adversidades estavam sempre dispostos a atender com dedicação e carinho a quem chegasse para uma visita. Uma verdadeira Casa de Caboclo, uma casa abençoada.

    Santos Reis – Mestre Representante do Núcleo Águas Claras – Manaus-AM.

  4. ayrton vinícius naves silva
    ayrton vinícius naves silva says:

    Eu era madeireiro em 1994 e cheguei em Campo Novo em busca de Mógno. Não encontrei o que fui buscar, mas me encontrei com a União do Vegetal, levado pelas mãos de um bêbado que, cruzando meu caminho no final daquela tarde, me perguntou se eu queria conhecer o Sr. Mariri. Para me ver livre dele, disse que sim e assim ele se despediu dizendo que às 19 hs voltaria para me levar ao encontro com o Sr. Mariri. Foi a primeira vez que me livrei de um bêbado com tanta facilidade; ledo engano! às 19 hs lá estava ele de volta e tive que cumprir com a minha palavra e lá fomos nós conhecer o dito homem. Quando chegamos, me deparei com um barracão coberto de palha de Buriti encrustado no meio da Floresta e pessoas cozinhando em 3 grandes panelas, sobre uma grande fogueira, alguma coisa que nem consegui imaginar o que poderia ser. Foi quando aquele bêbado (que nem fiquei sabendo como se chamava) gritou logo na entrada do barracão: “Mestre, trouxe aqui um amiguinho de vocês”. Fiquei completamente constrangido, mas um Senhor de nome Francisco veio me atender. Me apresentei e ele me explicou que estavam num preparo de Vegetal; não estendi muito bem, me pareceu um mutirão preparando alimento para uma festa popular e aí ele me perguntou se eu queria beber o Vegetal, só aí entendi que estavam preparando um Chá. Respondi que sim, quando me diz que não poderia me dar o Vegetal naquela noite, mas que eu voltasse no dia seguinte que ele me atenderia. Aí eu lhe disse: que pena, amanhã cedo volto pra Alvorada D’ Oeste e não poderei estar aqui pra beber este Chá com o Senhor e ele me disse: “em Presidente Médice tem um Templo como este, procure lá o Mestre e ele vai te atender. Após 15 dias, fui ver se achava aquele Templo e andando por aquelas estradas foi que encontrei com um casal de velhinhos que me mostrou o que eles chamaram de “Igreja do Cipó” onde fui bem recebido pelo Mestre Edson e numa inesquecível quarta-feira, lá estava eu bebendo o Vegetal pela primeira vez. Lembranças que não se apagam, que permanecem vivas na memória. Foi em Campo Novo onde se descortinou um Campo Novo na minha Vida.

    Hoje frequento o Núcleo Castanheira / 3ª Região.

    RESPOSTA: Oi, Ayrton. Grata pelo seu depoimento.

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