Na revista “O Cruzeiro”, há 50 anos, um olhar para os primórdios da UDV

Juliane Oliveira*

| 14 Julho, 2021

Foto original publicada na Revista O Cruzeiro: Rubens Américo | Colorização: Tiago Hoisel.

A reportagem Aioasca, o LSD da Amazônia, da revista O Cruzeiro, é de grande relevância para o acervo histórico do Centro Espírita Beneficente União do Vegetal e hoje está inteirando 50 anos. Publicada em 14 de julho de 1971, com texto de Joarez Ferreira e fotos de Rubens Américo, retrata, além da natureza simples da União do Vegetal, a presença de Mestre Gabriel, um Guia Espiritual que, pela firmeza no olhar ao comungar o sacramento sagrado do Chá Hoasca, revela-nos conhecer muito bem sua missão e responsabilidade.

Apesar de alguns equívocos e troca de palavras na reprodução de chamadas, está registrada, pelo olhar de dois experientes profissionais da comunicação, a realização de uma Sessão da União do Vegetal dirigida por seu fundador ao lado dos primeiros discípulos.

Acredita-se que, entre março e junho de 1971, Mestre Gabriel recebeu a visita da equipe de O Cruzeiro. A publicação não existe mais, tinha circulação semanal e chegou a ser a principal revista brasileira, mantendo correspondentes em Paris, Nova York, Roma e Tóquio.

A reportagem** ocupa quatro páginas da revista que nos revelam a União do Vegetal por um olhar alheio aos seus costumes e ritos. Repórter e fotógrafo encontraram um lugar pacífico, organizado e com um Guia Espiritual ciente da sua missão de “restabelecer o equilíbrio das leis do Vegetal”, conforme citação de Joarez.

Da cabeceira da mesa, Mestre Gabriel está assegurado de seus discípulos. Numa das fotos publicadas é possível identificar facilmente os Mestres Raimundo Monteiro de Souza, Raimundo Pereira da Paixão, Francisco Herculano de Oliveira, José Luiz de Oliveira, Francisco Adamir de Lima e Bartolomeu Pinheiro do Nascimento. Há também uma foto que destaca a participação do repórter Joarez na Sessão e, tanto a legenda quanto o próprio texto, afirmam que ele bebeu “aioasca” (grafada desta maneira). No último parágrafo, a citação direta de “bebemos aioasca” também deixa clara a participação do fotógrafo Rubens na Sessão.

Na mesa, além da vitrola e do disco “Tocador de Viola” (Turani e Silvanito, 1970), que chamou a atenção do jornalista, ali estavam também papel e caneta para registrar suas impressões a respeito do que intitulara de “o LSD da Amazônia”. Na própria reportagem é possível notar que o Joarez acompanhou, dentro da condição que a burracheira lhe permitiu, todo o ritual.

O olhar do fotógrafo

O registro fotográfico de Rubens Américo também tem seu destaque, uma vez que poucos são os registros daquela época e menos ainda são as fotos de Mestre Gabriel. As fotografias feitas naquele dia são como um relicário de imagens do criador desta Sagrada Obra Espiritual – por mais que, provavelmente, o fotógrafo não se desse ainda conta do valor que seu olhar e seu trabalho representariam para a União do Vegetal.

De todo o registro fotográfico, destaco duas imagens em especial: Numa delas, o menino Salomão Gabriel (filho de Mestre Gabriel) está em primeiro plano na frente da casinha simples de madeira coberta de palha e que ostenta em sua fachada a primeira bandeira da UDV – uma imagem que poucos conhecem ou sequer sabem que existiu. Na fotografia podem-se notar os traços caprichados na bandeira: uma estrela de seis pontas, uma árvore no canto direito que quase encosta no céu e, ao que parece, o desenho de uma lua nova no canto direito. A imagem da bandeira é pouco conhecida e este seja, talvez, o único registro fotográfico dela. A bandeira da UDV como conhecemos hoje está hasteada em muitos rincões do Brasil e presente em outros tantos países.

Noutra imagem, vemos Mestre Gabriel e Salomão Gabriel juntos próximos a um pé de Chacrona. Dessa vez, é o pai quem está em primeiro plano. Ao lado do pai, o menino é apenas um menino, sem perder a expressão firme do olhar – assim como o pai. Os dois crescem em semelhanças. Mestre Gabriel tem sua feição bem diferente da de outras fotos que conhecemos. Talvez, em razão da proximidade com o período em que voltou do tratamento de saúde em Fortaleza – levando em consideração a data de publicação da reportagem –, o registro revele um homem mais magro, rosto mais fino, mas com a característica que lhe é peculiar: a firmeza no olhar de um homem que sabe de sua missão.

>> Clique aqui e leia a matéria Visão da imprensa a respeito do Chá Hoasca vem mudando.

*Juliane Oliveira é integrante do Corpo Instrutivo da Sede Geral (Brasília-DF).

**A reportagem o “LSD da Amazônia” foi lida por Eugênio Magenta e, a partir da leitura, tempos depois, ele viaja a Porto Velho (RO) para conhecer a União do Vegetal. Retorna para Brasília e dá início, em 1974, junto com outros irmãos hoje sócios e dirigentes da UDV, à União do Vegetal no Distrito Federal.

5 respostas
  1. Alysson Bastos Sena
    Alysson Bastos Sena says:

    Importante registro para a memória dessa nossa sagrada religião. Sinto uma emoção grande e imagino estar presente naquele momento. Um grande marco para nossa União. Viva a União do Vegetal. Viva seus 60 anos. VIVA O MESTRE GABRIEL! Alysson Sena N. Caupuri

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  2. Luiz Guilherme Nascimento
    Luiz Guilherme Nascimento says:

    Foi essa reportagem que li, que me despertou o interesse pelo chá. E 22 anos depois, vim conhecer o chá da Hoasca, no dia 10 de julho de 1993. Onde sigo caminhando a 28 anos.

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  3. Cristiane Moura
    Cristiane Moura says:

    Imagino a alegria desses profissionais quando hoje vêem o tesouro que eles registraram. Viva nosso mestre que resistiu e não desistiu e aqui estamos bebendo dessa fonte infinita e sagrada.

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