Lançada pedra fundamental do Memorial José Gabriel da Costa

Em Porto Velho, à avenida Joaquim de Araújo Lima, 1.419, antiga rua Abunã, bairro Olaria, uma pequena casa será reconstruída. A pedra fundamental do projeto foi lançada na manhã do último domingo, na presença de centenas de pessoas de diversas partes do Brasil. Apesar de simples, a residência deverá atrair a visita de pessoas de todo o País e também de praticamente toda a Europa, Estados Unidos e Austrália.

No terreno, morava com sua família o ex-soldado da borracha José Gabriel da Costa, o Mestre Gabriel, que juntamente com alguns discípulos fundou o Centro Espírita Beneficente União do Vegetal (UDV). Trata-se da primeira religião genuinamente brasileira, iniciada no local onde agora existe apenas um terreno. Em geral, as pessoas que participam da sociedade e que não moram em Porto Velho querem ver onde a União do Vegetal começou.

Na solenidade de lançamento da pedra fundamental, o Mestre Jair Gabriel da Costa, de 61 anos de idade, pertencente à administração geral da UDV, explicou que em 1965 Porto Velho não era como é hoje. No local havia duas pequenas casas, uma onde morava Mestre Gabriel com a família e outra onde era distribuído o chá Hoasca.

“Por trás das casas já havia floresta. Hoje eu moro fora de Rondônia, em uma cidade grande. Me perguntam como era o lugar onde se começou a distribuir o Vegetal em Porto Velho. Por mais que eu explique, sempre tem a compreensão local, baseada no lugar onde a pessoa vive. E temos aqui presente o (discípulo) mais antigo. O primeiro que chegou, o Mestre Braga”, disse o Mestre Jair.

Raimundo Carneiro Braga, o Mestre Braga, de 82 anos, contou que encontrou com o Mestre Gabriel no início de julho de 1965, em sua casa, naquele terreno. Ele explicou que naquele lugar não havia praticamente nada materialmente, mas havia o Mestre Gabriel.

“Por isso eu sempre digo que no começo não tínhamos nada, mas ao mesmo tempo tínhamos tudo. A União do Vegetal nasceu dentro da simplicidade. Nosso Mestre viajou mas nos deixou aqui, para dar continuidade ao seu trabalho”, disse Mestre Braga.

Réplica

Durante o lançamento da pedra fundamental do Memorial José Gabriel da Costa, o Mestre Central da Primeira Região, que abrange Porto Velho, Candeias e Guajará-Mirim, Mestre Luiz Cardoso, explicou que sócios de todo o Brasil e do exterior constantemente chegam a Porto Velho e pedem para visitar o lugar onde morava o Mestre Gabriel. “Mostrávamos o terreno e explicávamos como era a casa”, detalhou.

Mestre Luiz Cardoso disse, ainda, que Porto Velho é uma cidade citada constantemente nos núcleos da União do Vegetal no exterior, onde os discípulos precisam aprender a falar Português para receber graduações dentro da sociedade. Segundo ele, o memorial deve trazer muita gente à Capital de Rondônia, porque os sócios vão querer conhecer a réplica da residência.

O Mestre Mário Filho, integrante do Conselho da Representação Geral da UDV, explicou que o trabalho desenvolvido pelo Memorial José Gabriel da Costa é muito importante, porque colabora com a preservação das raízes da União do Vegetal. Ele participou de duas sessões na residência do Mestre Gabriel.

De acordo com o Mestre Mário Filho, deve ser lembrado o trabalho desenvolvido pelo Mestre José Carlos Garcia, o primeiro presidente do Memorial José Gabriel da Costa.

Preparativos

O presidente do Memorial José Gabriel da Costa, Mestre Plinio Martins de Oliveira, coordenou durante dois meses as atividades no terreno onde foi lançada a pedra fundamental. O trabalho foi intensificado durante as últimas duas semanas. Ele explicou que já realizou uma campanha de doação e deverá iniciar outra, para começar logo a construção.

O resultado do trabalho agradou as pessoas que estiveram presentes à solenidade. O muro foi pintado de azul e branco e o portão foi trocado. Como havia possibilidade de chuva, oito tendas foram alugadas, cobrindo quase todo o terreno. Lonas também foram utilizadas para terminar a cobertura e foram alugados banheiros químicos.

Mestre Plínio explicou que o Memorial José Gabriel da Costa não será unicamente a réplica da casa do fundador da UDV. Segundo ele, a intenção é que Porto Velho seja um centro de pesquisas do chá Hoasca. “Queremos oferecer aos interessados um local onde seja possível ter acesso a informações e estudos científicos sobre o Vegetal que utilizamos em nossos rituais religiosos”, acrescentou.

O secretário de Cultura, Esportes e Lazer, Francisco Leilson “Chicão”, que também participou da solenidade, disse que o memorial é importante para mostrar a origem da União do Vegetal. Professor de História, Chicão afirmou ser importante preservar as raízes da primeira religião criada no Brasil, que está se expandindo em diversos países.

“Em nome do Mestre Braga, cumprimento todos os mestres presentes nesta solenidade. Com essa atividade será possível mostrar parte do legado deixado pelo Mestre Gabriel, o fundadorda UDV. É importante manter viva qualquer iniciativa que leve o bem para a humanidade”, disse Chicão.

O secretário da Secel adiantou que já havia tido contato com o projeto anteriormente, reconhecendo sua importância. “Rondônia deve intensificar o trabalho de preservação da cultura de seu povo. O poder público precisa apoiar e também incentivar iniciativas como essa”, afirmou.

Plantio

Mestre Pequenina, de 83 anos de idade, viúva de Mestre Gabriel, disse durante a solenidade que estava relembrando quando a família morava naquele pedaço de terra. Ela contou que inicialmente Mestre Gabriel falava em ir para Salvador (BA), mas como lá não havia o cipó Mariri e a árvore Chacrona, cujas folhas são utilizadas para preparar o Vegetal, também conhecido como Hoasca, todos ficaram em Porto Velho.

“A União do Vegetal começou como se fosse um plantio. Depois, Mestre Gabriel, juntamente com alguns discípulos, conseguiu um terreno um pouco mais distante daqui. Naquele lugar foi construído o Núcleo Mestre Gabriel. Agora, essa área onde moramos anteriormente jamais será esquecida. Aqui se originou essa sociedade”, disse Mestre Pequenina.

O Mestre Geral Representante, Francisco Herculano de Oliveira, de 77 anos, pediu à irmandade que apoie no que for possível o presidente do Memorial Mestre Gabriel, Plínio Martins de Oliveira, dentro de suas atribuições. Ele afirmou que o trabalho que será realizado no terreno onde residia o fundador da União do Vegetal é importante para dar à sociedade uma demonstração do que representa a UDV.

“Nós que estamos aqui sabemos muito bem o que significa esse chá misterioso. Mas é bom mostrar isso às demais pessoas. Desejo que Mestre Gabriel, o nosso guia espiritual, esteja sempre presente em nossas vidas. E que este memorial receba o auxílio de todos os sócios, não somente dos que residem em Porto Velho. Apoio é fundamental, principalmente no início desse trabalho”, acrescentou Mestre Herculano.

Cápsula

Após a composição da mesa e depois do pronunciamento de fundadores do Centro Espírita Beneficente União do Vegetal e do secretário Francisco Leilson “Chicão”, houve o lançamento da cápsula do tempo. Trata-se de uma urna hermeticamente fechada onde são colocados alguns documentos para a posteridade.

O Mestre José Carlos Garcia colocou cópia do estatuto do Memorial José Gabriel da Costa, enquanto Mestre Braga inseriu na cápsula exemplares de jornais que noticiaram o lançamento da pedra fundamental. A Conselheira Dioneia Braga colocou cópia de uma carta enviada pelo Mestre Gabriel ao Bacurau, um dos primeiros discípulos do Mestre. A Conselheira Jandira Gabriel inseriu cópia de um documento publicado por Mestre Gabriel no jornal Alto Madeira, chamado “Velado enquanto dorme”.

Logomarca

A logomarca da Associação José Gabriel da Costa foi desenvolvida pelo design gráfico Walter Badaró e traz em sua composição a forma de um selo inspirado nas diversas cartas que o Mestre Gabriel mandou aos seus discípulos conceituando desta forma o caráter da Associação de ser um Memorial. A imagem de uma casinha representando a antiga sede sob o sol, lua e estrela trazendo o Símbolo da União representa a recriação da UDV.

No final da solenidade o Mestre Carmiro Gabriel depositou sob a cápsula a tampa de isolamento e Getúlio Gabriel a fixou com argamassa e areia.